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sábado, 21 de dezembro de 2024

Professor sofre discriminação por conta da aparência ao tentar ingressar em escola militar

O professor de Educação Física Gibran Freitas, servidor concursado do Estado há 11 anos na rede pública Estadual de Ensino, passou por uma situação desrespeitosa e constrangedora na última segunda-feira (25), durante o processo de atribuição de aulas no município de Barra do Garças (a 520 km de Cuiabá).

Segundo informações do professor, o fato aconteceu quando ele, assim como outros educadores, fazia a contagem de pontos onde a partir daí seria definida qual unidade de ensino poderia lecionar durante este ano letivo. Ele foi lotado para a escola militar Tiradentes, antiga Escola Estadual São João Batista.

Ao procurar a assessoria pedagógica para dar início ao seu trabalho, o professor ouviu de um assessor pedagógico, diante de todos seus colegas que estavam no local, que para lecionar naquela unidade de ensino teria que passar por uma “readequação”, que consistia em raspar a barba, não usar mais o brinco (que usa em uma das orelhas), e ainda esconder suas tatuagens, fazendo uso contínuo de camisas com mangas longas.

“Não estudei e nem prestei concurso para ser policial militar. Sou um educador e apesar de todo o respeito que tenho pelas forças de segurança, a escola não é local para se aplicar às mesmas regras que regem o militarismo. A escola é um lugar que precisa resguardar a pluralidade e diversidade dos indivíduos, e acima de tudo, lugar onde prevaleça a democracia. Ouvir que eu não poderia ter a minha identidade respeitada, na frente de todos, me deixou totalmente sem reação”, conta o educador.

O professor informou o caso ao Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso (Sintep), e também ingressou uma representação junto ao Ministério Público Estadual (MPE). Ele contratou advogado para defendê-lo por dano moral, argumentando que foi vítima de discriminação pela aparência.

A Secretaria de Educação do Estado de Mato Grosso (Seduc), ainda não se manifestou sobre o assunto. Ao Única News, a assessoria de imprensa apenas disse que em breve a pasta emitirá nota sobre o caso.

O Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso (Sintep) emitiu uma nota de repúdio em apoio ao professor.

Veja abaixo:

O Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso repudia veementemente o atentado a dignidade humana e liberdade de Cátedra sofrida pelo Professor Efetivo de Educação Física da SEDUC-MT, sindicalizado, cidadão e dirigente Sindical do Sintep/MT Subsede de Barra do Garças, Gibran Dias Paes de Freitas, que, ao ser atribuído para trabalhar na Escola Militar Tiradentes, antiga Escola Estadual São João Batista, de Barra do Garças (a 520 km de Cuiabá) fora comunicado que só poderia exercer a atividade educacional se tivesse a barba e cabelos cortados. Além disso, recebeu a determinação para que fizesse uso permanente de camisa de mangas longas para esconder suas tatuagens e, foi informado também que deveria tirar o brinco que usa em uma das orelhas.

Tal atitude desrespeita a dignidade humana e demonstra a intolerância que acomete a nossa sociedade. Intolerância esta, que está sendo propagada para dentro das nossas unidades escolares por meio da entrega da gestão das nossas escolas públicas para as forças de segurança (polícia militar, polícia rodoviária federal e Corpo de Bombeiros).

Manifestamos o total repúdio à política de militarização de escolas públicas em Mato Grosso, capitaneada pelo Deputado Estadual Silvio Fávero (PSL), intensificada a partir de 2020. Um processo que ocorre por meios truculentos, antidemocráticos, envolvendo a secretaria de educação (Seduc), Prefeitos, Vereadores e os comandos das polícias militar, Rodoviária Federal e Corpo de bombeiros, para implantar nas escolas civis públicas a chamada “metodologia de ensino” dos colégios da Polícia Militar em favor de implementação das chamadas escolas cívico-militares.

Esse processo faz com que militares das diferentes polícias (Exército, Civil, Federal e Militar) e corpos de bombeiros, adentrem às escolas civis públicas, nas funções de diretores administrativo, pedagógico, além de monitores ou instrutores dos estudantes. Essa atuação reorganiza o trabalho pedagógico imprimindo práticas desenvolvidas nos quartéis, hierarquia, disciplina subserviente, ritos militares, uniformização e apagamento das subjetividades, obrigando que todos/as estudantes se portem da mesma forma, usem penteados e cortes de cabelos iguais e batam continência.

As justificativas utilizadas pelos governos para implementar a militarização são comuns, destacando-se: a) “baixa qualidade educacional” oferecida nas escolas públicas e a necessidade de melhoria dos índices educacionais; b) combate à violência; c) valorização do discurso militar da disciplina, hierarquia, ordem, respeito e controle; d) criminalização da pobreza; e) desvalorização da escola pública e da gestão democrática.

A comparação pura e simples de resultados, sem considerar diversos fatores é desonesta e resvala, quase sempre, na falácia de responsabilizar os profissionais da educação ou os estudantes e suas famílias pelo “fracasso escolar”. Do mesmo modo é equivocado atribuir o bom desempenho dos genuínos colégios militares do Exército apenas ao ideário militarista desconsiderando as especiais condições dessa oferta educacional: custo por aluno maior, no mínimo quatro vezes o custo médio nacional da rede pública; maiores salários compatíveis com a formação dos profissionais da educação; seleção do público atendido (ingresso nas unidades passa por exames seletivos); oferta de educação integral; excelente infraestrutura, equipamentos, tecnologia, laboratórios.

O espírito conservador das corporações militares requer estudantes à sua imagem e semelhança, obedientes e que acatem ordens, sem permissão para expressar um pensamento diferente ou questionar. Nas escolas militarizadas as marcas indenitárias são compreendidas como subversão e a condição ontológica de gênero, raça-etnia, classe social e território devem ser anuladas. É um ataque às subjetividades e ao pertencimento que se contrapõe à estética indenitárias e visa o apagamento de sua força e filiação. Ataque legitimado por um discurso militarista equivocado de “disciplina, hierarquia, ordem, respeito e padronização”.

O processo de militarização está na contramão do direito conquistado e no disposto na legislação. A escola pública, fruto de muita luta dos trabalhadores e estudantes, é prevista nesses marcos legais como plural, democrática, pública, universal, laica, gratuita, de qualidade socialmente referenciada que reconhece e valoriza nossa diversidade. Ao entregar as escolas para as polícias – que não tem formação para educar – impõe-se o apagamento da identidade dos jovens, adolescentes e dos Educadores; criminaliza-se estudantes, comunidades e territórios empobrecidos; e, amordaçam-se as múltiplas vozes que constituem nosso povo e que denunciam, à plena voz, a injustiça social e a necessária positivação de direitos que exigimos.

Desse modo o Sintep-MT conclui manifestando-se radicalmente contrário à demonstração de intolerância, preconceito, ataque à dignidade humana e liberdade de cátedra justificada por dogmas e preceitos das escolas públicas militarizadas em Mato Grosso e solidariedade ao professor Gibran Dias Paes de Freitas, se colocando à disposição para que tal agressão à dignidade humana e de cátedra não fique impune.

Assim como, reafirmamos a defesa intransigente do sindicato, pela escola pública como espaço universal do exercício democrático de diálogo, pautada por relações horizontais, organização livre dos estudantes, que acolhe e valoriza as marcas éticas, estéticas e identitárias de raça-etnia, cultura, território, gênero e sexualidade.

Cuiabá, 27 de janeiro de 2021.

Direção Estadual do Sintep/MT

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