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domingo, 22 de dezembro de 2024

Vítima de violência doméstica escreve bilhete e pede socorro em agência bancária

Você pode me ajudar”. A frase, seguida de um “Xis” e das palavras “violência doméstica”, foi escrita por uma mulher, de 27 anos, dentro de uma agência bancária em Sobradinho, no Distrito Federal, na última segunda-feira (1º).

A vítima estava em um caixa, fazendo o saque do Bolsa Família, e entregou o bilhete ao funcionário do banco. No texto, ela ainda alertou: “Ele tá aí fora”.

O bancário entendeu o pedido de socorro e foi atrás da polícia com os colegas da agência. Ele, que preferiu não se identificar, conversou com o G1, por telefone, nesta quarta-feira (3).

O homem, de 40 anos, contou que na hora em que recebeu o bilhete, pediu para a vítima anotar os dados, como telefone e endereço. “Mas a mulher ficou com medo de passar o telefone e o companheiro atender”, disse.

“Depois que ela foi embora, fiquei procurando uma forma de ajudá-la. Fizemos uma pequena reunião para ver o que poderíamos fazer”, contou.

O desenho do xis com o pedido de ajuda é uma orientação da campanha para ajudar mulheres vítimas de violência doméstica lançada em junho de 2020.

Na semana passada, seguindo as mesmas instruções da campanha, uma mulher de Anápolis, interior de Goiás, pediu ajuda em uma rede social. Ela e o marido, que é caminhoneiro, estavam em viagem. O homem foi preso por cárcere privado e violência doméstica após ser abordado por policiais em Bady Bassitt, no estado de São Paulo.

Descaso

Junto com os colegas do banco, ele decidiu ir até a 13ª Delegacia de Polícia, de Sobradinho. Mas o policial de plantão não registrou a ocorrência.

“Ele leu, leu, olhou o papel e disse que era jurisdição de Planaltina porque a mulher morava lá. Eu questionei se ele não poderia fazer contato com alguém, mas ele não deu a mínima pra mim”, contou o bancário.

O bancário disse ainda que chegou a ligar para a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) para informar o ocorrido, mas também não foi atendido. “Um homem atendeu e disse que era pra denunciar no 197, porque tinha que apurar se aquilo era verdade mesmo”, revelou.

 “Sobra burocracia e falta empatia. Cheguei no outro dia no banco desnorteado”, disse o bancário.

A Polícia Civil disse que “o caso está sendo apurado com máxima prioridade” e que prestará todas as informações pertinentes.

Coragem e busca de solução

A telefonista do banco, Juliana Gomes da Silva, que no dia seguinte ajudou o colega, destaca a coragem da mulher. “Por estarmos no meio de uma pandemia, ela só pôde entrar sozinha. Foi o momento em que ela se sentiu segura e pediu ajuda. Ele [o agressor] estava ligando o tempo todo pra ela ir rápido”, contou.

Após saber das tentativas frustradas do colega para registrar o caso na Polícia Civil, Juliana decidiu falar com uma amiga, que é policial militar do batalhão de Planaltina. Ela mandou fotos dos bilhetes: o que pedia ajuda e um segundo, onde a mulher concordou em escrever o endereço.

O texto, além do endereço, descrevia como achar a quitinete onde a vítima morava, dando características como a cor do portão. Ao final, a mulher também fazia mais um pedido, para que os policiais insistissem.

“Pela experiência que tenho, no momento em que li os bilhetes, já entrei em contato com a amiga que trabalha na PM. A vítima foi breve e rápida. Ficamos todos apreensivos”, contou Juliana, que também é coordenadora da Central Única das Favelas (CUFA-DF).

Final da história

Após a denúncia, policiais militares do grupo de Prevenção Orientada à Violência Doméstica e Familiar (Provid) foram atrás das informações escritas nos dois bilhetes. Ao chegar no endereço, eles descobriram que a mulher era mantida em cárcere privado pelo companheiro, no setor Estância Mestre D’Armas, em Planaltina.

No endereço, em uma segunda tentativa – na primeira, aparentemente não havia ninguém em casa – a equipe encontrou a mulher e os dois filhos: um menino de 1 ano e 7 meses e uma menina 5 anos. A vítima confirmou que tinha escrito o bilhete pedindo ajuda.

 “Ela confirmou que o marido fazia agressões verbais […] percebi que ela estava com medo. Não é de hoje que ela é vítima de violência doméstica” disse o sargento da PM Sérgio Borges.

Em 2019, a mesma mulher já havia sido atendida após uma denúncia de violência. “Agora é com a Justiça. A nossa parte a gente fez. Ela pode receber medida protetiva e, dependendo do entendimento, o juiz expede mandado de prisão pra ele”, explicou o sargento.

A vítima foi encaminhada para uma Casa Abrigo. Até a tarde desta quarta-feira (3), o agressor não havia sido localizado.

Casa Abrigo

O abrigo onde a mulher e os filhos estão recebe vítimas de violência doméstica que registram ocorrência policial no DF. Segundo informações da Secretaria da Mulher, a vítima “está serena e disse que se sente aliviada”.

A casa é protegida, e o endereço mantido em sigilo, para segurança das abrigadas. As vítimas têm acesso aos serviços de alimentação, segurança e transporte.

” Esse caso foi muito emblemático. A primeira coisa que o agressor faz é impedir a mulher de se comunicar. Essa vítima, ao ter oportunidade de sair de casa, resolveu pedir ajuda e as pessoas entenderam o recado. Isso mostra como a sociedade está mais atenta. Esse é o caminho”, diz a Secretária da Mulher do DF, Ericka Filippelli.

Sinal vermelho X

Ainda este mês, a Secretaria da Mulher disse que pretende abrir inscrições para que estabelecimentos do DF participem da campanha Sinal Vermelho, uma lei regulamentada em janeiro deste ano. Segundo o texto, para pedir socorro, as vítimas precisam escrever um “X” na palma da mão, com caneta, batom ou outro material acessível, se possível na cor vermelha.

O sinal deve ser mostrado com a mão aberta aos funcionários desses estabelecimentos que, por sua vez, precisam adotar um protocolo de atendimento (veja mais abaixo) e acionar as forças de segurança. A medida vale para:

Farmácias

Repartições públicas

Portarias de condomínio

Hotéis

Supermercados

De acordo com o decreto, a norma continuará em vigor após o fim da pandemia de Covid-19, como estratégia de fortalecimento da Rede de Proteção à Mulher.

O texto afirma que, ao atender uma mulher que apresente o “sinal vermelho”, os funcionários devem manter a calma. A vítima precisa ser encaminhada para uma sala segura, onde possa aguardar atendimento especializado, sem chamar a atenção dos demais clientes ou do possível agressor, que possa estar acompanhando ela. A polícia deve ser acionada imediatamente.

G1/DF

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