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domingo, 22 de dezembro de 2024

Antipolítica e marketing criam ruídos e são entrave para Doria

“Não sou politico, sou gestor.” O mote que elegeu João Doria (PSDB) prefeito de São Paulo no primeiro turno em 2016 agora pode representar um entrave para sua aspiração à Presidência da República em 2022.

Longe de ser unanimidade no PSDB e com a já conhecida dificuldade de articulação, Doria precisaria acenar à política tradicional para construir alianças, segundo membros do partido. Nesse sentido, o estilo empresarial de seu governo é visto como obstáculo.

Entre políticos ouvidos de forma reservada pela Folha, há reclamações de diversos tipos a respeito das práticas de Doria.

Entre elas, as regras rígidas para reuniões (sem celular e sem atraso) e a quantidade de entrevistas coletivas, além do fato de não receber prefeitos para foto e cafezinho (como fazia Geraldo Alckmin), de exagerar no marketing e de não ter dado mais cargos a aliados.

Escolhas pessoais e técnicas acima de indicações partidárias para a composição do governo representam um ativo aos olhos do eleitor, mas complicam a formação de um grupo político para sustentar a candidatura.

Em 2018, quando venceu a eleição para o Governo de São Paulo, Doria resolveu dar ares de ministério ao seu secretariado, já com vistas a 2022.

Na ocasião, importou seis nomes do governo Michel Temer (MDB) -Henrique Meirelles (Fazenda), Alexandre Baldy (Transportes Metropolitanos)”, Rossieli Soares (Educação), Sérgio Sá Leitão (Cultura), Vinicius Lummertz (Turismo) e Gilberto Kassab (Casa Civil), que deixou o governo.

Baldy, do PP, tem o aval de caciques do partido para ocupar a secretaria, mas não vincula o apoio da sigla do centrão a Doria -é tido como uma escolha pessoal do governador.

O mesmo pode ser dito sobre Meirelles, que trocou o MDB pelo PSD no momento em que o presidente do PSD, Kassab, desembarcava do governo tucano de vez.

Kassab tem dito que seu partido terá presidenciável próprio, algo encarado com ceticismo no mundo político. Mesmo com Meirelles no governo, há o entendimento de que o apoio do PSD não está vinculado a Doria.

Já o MDB foi amarrado a Doria por meio da indicação do vice-prefeito Ricardo Nunes na chapa à reeleição de Bruno Covas (PSDB) na cidade de São Paulo. O Republicanos ocupa a Secretaria de Esportes com Aildo Rodrigues Ferreira.

O DEM, tido como aliado mais importante de Doria, tem mais espaço. O vice-governador Rodrigo Garcia é também secretário de Governo, e a Secretaria de Logística e Transportes é espaço do partido, embora seja ocupada por um nome técnico, o engenheiro João Octaviano Neto, que é filiado ao DEM.

Garcia é o nome escolhido por Doria para sucedê-lo em 2022 no governo do estado. Em troca, o vice traria o DEM para a aliança nacional do tucano –isso se Doria não desistir da disputa ao Planalto para concorrer à reeleição no estado, algo que já admite.

O PSDB tem Marco Vinholi (Desenvolvimento Regional), Cauê Macris (Casa Civil), Celia Leão (Direitos da Pessoa com Deficiência), Flavio Amary (Habitação) e Wilson Pedroso (Secretaria Particular) –este último acompanha Doria desde a prefeitura.

No mais, o grosso do governo é formado por nomes escolhidos por Doria, alguns egressos da iniciativa privada, como Gustavo Diniz Junqueira (Agricultura e Abastecimento) e Patricia Ellen (Desenvolvimento Econômico), e outros com experiência na vida pública, como Mauro Ricardo (Projetos, Orçamento e Gestão), Marcos Penido (Infraestrutura e Meio Ambiente) e Julio Serson (Relações Internacionais).

Ainda assim, Doria teve dores de cabeça ao tentar acomodar aliados políticos no governo. Kassab, Aloysio Nunes (PSDB) e Barjas Negri (PSDB) acabaram saindo de seus postos por envolvimento em escândalos de corrupção ou perda de direitos políticos –caso do terceiro.
Baldy chegou a ser preso, mas foi mantido.

“Auxiliares do governador afirmam que Doria comanda o estado como se fosse uma empresa, com metas e indicadores, e que isso causa estranheza no mundo político.

Apesar da reincidência de tropeços na construção da candidatura, o cenário não é de todo ruim para Doria. Se antes o governador se baseava em sua força de vontade ou obsessão com a eleição presidencial, agora tem o trunfo da vacina contra a Covid, com o qual espera agregar o PSDB em torno do seu nome.

A política partidária em segundo plano é um dos fatores que explicam narizes torcidos para Doria no partido.

Tucanos mencionam a tentativa de criar um “novo PSDB”, a quebra de confiança com Alckmin, o BolsoDoria e um histórico jantar no Palácio dos Bandeirantes que expôs o racha partidário –episódios criticados pela falta de articulação e excesso de inexperiência.

Para um tucano da velha guarda, Doria não tem o homem político dentro dele e, ao construir acordos, busca vantagens para si no lugar de contemplar os envolvidos.

A falta de construção política também ajuda a explicar rompantes e reações intempestivas de Doria, sobretudo em relação a Bolsonaro, enquanto nomes com mais tempo de vida pública avaliam que há exagero e que a institucionalidade deve ter peso maior.

Como mostrou a Folha, tucanos avaliam que, cercado de técnicos, Doria carece de um grupo político mais robusto. Ou seja, aliados que funcionassem como radares contra erros evitáveis, como a ida a Miami no fim do ano passado, o jantar com a cúpula do PSDB e os prejuízos marqueteiros nos anúncios da Coronavac e da Butanvac.

Desde 2016, quando Doria foi eleito pela primeira vez, a política foi reabilitada. O descrédito da Operação Lava Jato e os prejuízos do governo Bolsonaro cancelaram a antipolítica –onda que o empresário tucano surfou, mas não lhe servirá em 2022.

Doria percebeu a mudança de ventos. Aliados o veem menos afoito do que quando tentou encarnar pela primeira vez o presidenciável tucano, ainda em 2017.

O governador fez gestos em nome de uma construção política, como admitir concorrer à reeleição e assinar um manifesto com outros cinco presidenciáveis.
Além disso, moderou o discurso de direita e adotou a defesa da democracia como prioridade, com acenos à esquerda -como a ligação para Gleisi Hoffmann (PT) para tratar de ameaças de morte ao ex-presidente Lula (PT). Nomes do entorno do governador afirmam que ele não fecha os olhos para a política. Lembram que Doria recebe parlamentares e aliados do cenário nacional com frequência no Palácio dos Bandeirantes nas reuniões semanais de secretariado.

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