Consultora financeira explica sobre a nova liberação de empréstimo para quem é beneficiário do BPC
Fonte: Gazeta Digital, créditos da imagem: Reprodução
Os municípios de Água Boa (730 km a leste de Cuiabá) e Canarana (823 km a leste da capital) são separados por menos de 90 km. Mais do que a proximidade geográfica, o que os une é o movimento de familiares em busca de justiça após perderem os filhos. Elas acusam negligência médica, falta de leitos e atraso no atendimento como fatores determinantes na morte das crianças.
A morte de 3 crianças no Hospital Regional Paulo Alemão, em Água Boa, mobilizou familiares das vítimas a se voltarem contra a unidade e a saúde municipal. Uma petição foi criada pedindo intervenção no hospital, que é o maior da região. A petição foi organizada por Sandra Aparecida Batista Suares, mãe de Anthony, de 4 anos, falecido no começo de julho deste ano.
Ao longo, foram realizadas 5 manifestações envolvendo familiares das vítimas e moradores, incluindo uma delas na Câmara dos Vereadores.
No dia 4 de julho, Anthony deu entrada no hospital por volta de 1h da manhã, com sintomas gripais, vômito e dor abdominal. Ao GD, a mãe relatou a cronologia do caso, onde ela acredita que diversas situações no hospital levaram à morte da criança.
Um dos pontos levantados por Sandra é que o filho só realizou a tomografia às 12h, isto é, passou a madrugada e boa parte da manhã em observação, sofrendo com dores. A demora na tomografia, conforme relata a mãe, ocorreu porque o médico responsável pelo exame estava no desfile da cidade.
Outro fator é que a criança só foi internada na pediatria por volta das 15h30, após apresentar piora nos sintomas. Sandra afirma que os médicos diziam que faltava leito. Ainda, segundo ela, ao entrar na pediatria, uma das funcionárias teria lhe contado que havia leito disponível desde 9h da manhã.
A pediatra plantonista no dia era Janaina Esteves. De acordo com documentos ao qual o GD teve acesso, ela estava em plantão de sobreaviso entre 19h do dia 4 até às 7h do dia 5 de julho.
Aproximadamente às 22h, Janaina foi avaliar Anthony, o medicou e foi embora para casa. Durante a madrugada, o quadro da criança piorou significativamente. Relatos dão conta de que diversas ligações foram feitas para a pediatra plantonista, que não compareceu ao hospital. Por volta de 5h da manhã, o médico Hildebrando Meneses, marido de Janaina, foi ao hospital e realizou a intubação de Anthony. Pouco tempo depois, como relatam os médicos, o garoto sofreu 5 paradas cardíacas e não resistiu.
Sandra afirma que o filho estava consciente antes da intubação, e diz que viu sangue sair da mangueira quando o garoto estava entubado. Não existem provas, porém, de que houve erro médico no procedimento.
A mãe da vítima moveu um processo na Delegacia de Água Boa contra o Hospital Regional Paulo Alemão por negligência. O caso foi arquivado por falta de provas.
Ela também realizou denúncia no Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso (CRM-MT), que apura o caso.
Ainda, ela denunciou a pediatra Janaina Esteves no Ministério Público por omissão de socorro. Ela questiona por que a médica não compareceu ao hospital, mesmo em sobreaviso, e por que Janaina assinou a intubação de Anthony, que foi realizada por Hildebrando.
Na defesa, a pediatra relata que orientou os médicos plantonistas que estavam no hospital para tratar Anthony. Ela ainda afirma que enviou o marido para realizar a intubação porque, como ele trabalhava na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), estaria mais acostumado ao procedimento.
A reportagem também entrou em contato com a defesa de Janaina para maiores esclarecimentos, mas não obteve respostas até o momento.
Reprodução
Um outro caso, onde familiares também apontam negligência médica, aconteceu com Vaioleth, de 1 ano. Em maio deste ano, ela foi ao Hospital Regional Paulo Alemão, acompanhada dos pais, Vani Matiusso e Fernando Barbosa, com sintomas de febre e tosse, quando foi feito um raio-x. A médica disse se tratar de uma virose, passou alguns remédios e liberou a criança. Dois dias depois, Vaioleth voltou ao hospital, com febre, tosse e falta de ar. A mesma médica realizou o atendimento. Segundo relato de Bruna Carla, tia de Vaioleth, a profissional afirmou que os sintomas eram “normais”, e falou para mãe aguardar de 5 a 10 dias, para que os remédios fizessem efeito.
Dois dias depois, Vaioleth retornou ao hospital com os mesmo sintomas. Um outro médico recomendou um novo raio-x, que detectou que 100% do pulmão da criança estava tomado por um líquido. Ela chegou a ser encaminhada para Primavera do Leste (231 km ao sul de Cuiabá), mas não resistiu. A mãe, arrasada com a situação, não teve forças para enterrar a filha e se mudou para o Paraná.
O GD também conversou com Aline Silva, mãe de Isabella, de 9 anos, outra vítima que veio a óbito no Hospital Regional Paulo Alemão. Aline alega descaso dos médicos no atendimento da criança, que chegou à unidade de saúde por volta das 22h do dia 19 de agosto deste ano, com sintomas de febre, dor de cabeça, nos braços, nas pernas e batimento acelerado.
“Lá pela 00h40, o médico chegou e disse que os exames [de sangue e tomografia] estavam tudo ok. Eu penso que ele deveria ter pedido um raio-x do pulmão. Ele não fez uma checagem completa. Ele nem examinou ela”, contou.
Segundo ela, Isabella ficou mais de 1h convulsionando no hospital. Ela alega que a criança recebeu um remédio para convulsão, mas depois continuou com as crises e não teve atendimento.
“Quando foi 4h da manhã, eles vieram me informar que ela tinha ido a óbito. Segundo eles, não sabiam o que aconteceu para ela vir a óbito tão rápido. A gente ficou de 22h da noite até 3h da manhã com essa criança, e eles não fizeram questão de saber o que ela tinha”, relatou.
“A enfermeira que tentou entubar ela, disse que o tubo estava cheio de catarro, e que isso era algo que eles tinham que ter visto antes”, completou.
A reportagem entrou em contato com o Hospital Regional Paulo Alemão para possíveis esclarecimentos, mas não obteve resposta até a publicação.
Cerca de 90km a leste de Água Boa, moradores de Canarana também reclamam da saúde municipal. O movimento “Mães de Canarana”, criado por Vanessa Gnadt Rauber, que perdeu o filho Thales, recém-nascido, em fevereiro deste ano, pede intervenção na saúde pública do município.
“O enfermeiro que atendeu meu filho após o nascimento, no dia 09 de fevereiro, não fez os procedimentos corretos com ele. Ele ficou mais de 10 horas sem que nenhum médico viesse no quarto olhar como os recém nascido estavam. Meu marido que percebeu a respiração dele mais forte, e foi então que colocaram ele no oxigênio”, contou ao GD.
Logo após colocarem o recém-nascido no oxigênio, ele foi encaminhado para a cidade vizinha, Água Boa, onde existe pediatra neonatal. No dia 11, porém, ele veio a óbito.
O movimento criado por Vanessa relaciona a falta de médicos especialistas, como pediatras, com a alta taxa de mortalidade infantil no município.
Uma estatística alarmante que liga um alerta para Água Boa e Canarana é o alto índice de mortalidade infantil. Segundo dados de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de mortalidade infantil em Água Boa é de 26,49 e em Canarana é de 21,41, ambos significativamente superiores ao índice do estado de Mato Grosso, que é de 14,08. O índice leva em conta as mortes de crianças com menos de um ano de idade. Os números revelam problemas estruturais profundos na saúde dos dois municípios.
Outro lado
Reportagem do GD entrou em contato com as Prefeituras de Água Boa e Canarana, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestação.